Estudando História, os livros de Laurentino Gomes

Já falei sobre livros de história aqui no Dose - em 2014 - no tempo em que ainda não era colaborador oficial, e a Patrícia postava meus textos.  Veja aqui meu comentário sobre "Brasil - Uma História, de Eduardo Bueno.

Continuando na importante tarefa de saber mais sobre nosso passado, tive a oportunidade de ler a trilogia de Laurentino Gomes. A escolha desses livros tem razões parecidas com o primeiro. Não sou, nem pretendo ser erudito do assunto, então procuro tateá-lo pelas beiradas, utilizando para isto os exemplares mais digeridos e lúdicos. A escolha, neste sentido, foi acertada. Recomendo a leitura fácil, quase juvenil que se pode fazer desses livros.
1808 - Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil 
1822 – Como um homem sábio, uma princesa triste, e um escocês louco por dinheiro ajudaram dom Pedro a criar o Brasil – um país que tinha tudo para dar errado
1889 – Como um imperador cansado, um marechal vaidoso e um professor injustiçado contribuíram para o fim da Monarquia e a Proclamação da República no Brasil.

Tampouco tenho motivações políticas para isto. Concordando com a crítica de minhas amigas de blog, sou ainda bastante ingênuo, e preciso estudar bastante - de Marx a Mises (autores que já conheci, ainda que parcialmente). Tento manter minha mente essencialmente democrática, conhecendo os argumentos de diferentes espectros políticos, diferentes formas de organizar a economia (tema que tenho lido com mais intensidade, desde 2012) e a sociedade.

"O Brasil tinha 5,4 funcionários públicos para cada mil habitantes, o dobro dos Estados Unidos, com 2,4 funcionários por mil habitantes. O emprego público representava 70% das despesas do governo em 1889. Cargos na administração eram concedidos em troca de apoios ao governo, que assim formava sua clientela"

Reitero o escrito na resenha supracitada: acho o ódio mal conselheiro. Suspeito que todos nós brasileiros queremos o país mais justo e feliz, apenas discordando sobre os caminhos que devem ser trilhados para este resultado. Minha angústia é perceber que nem todos pensam assim. A percepção no momento é de uma sociedade cindida - como se não houvesse vantagens no sonho comum, e diferentes grupos estivessem a todo o tempo tentando "ferrar" os demais.  Longe de buscar consensos, o argumento do outro é como a sedução do Satanás para os religiosos. 

Lados opostos num mesmo país, mas que país não tem isso? Da abertura dos portos  à proclamação da República, estamos fartos em exemplos. Há inúmeros casos na história em que esta tensão represada termina em violência ou separação territorial (no passado um risco enorme). Dessas hipoteses já vejo a primeira como mais provável, se manifestando em diferentes níveis. Quanto mais agressividade acumulada de lado a lado, mais distantes estamos de remar o barco para um destino comum, mas é assim em toda a convicção. Se o outro não concorda com o que achamos óbvio, então é porque é tolo e não enxerga tanto quanto nós. O duro, ou irônico, é que o outro pensa o mesmo de mim!

"As degolas da Revolução Federalista são um exemplo eloquente do clima de ódio que se instalou no Brasil nos anos seguintes à Proclamação da República, em especial no período entre a ascensão de Floriano Peixoto, em novembro de 1891, e a posse do segundo presidente civil, Campos Salles, sete anos mais tarde. (1889)"

A história traça seu rumo, movida com nosso protagonismo - é claro -  mas por caminhos intrincados que mesmo após muito tempo são difíceis de decifrar e destilar. Há posicionamentos ideologicos nesses livros? Pode apostar. Não existe nada neutro. Cabe a nós continuarmos nosso esforço de estudo, ver os fatos por outras fontes, arrancar as "cracas" de convicções passadas, renovar. 

Da leitura dos três livros, a constatação triste de que os mesmos problemas de nosso nascimento como país estão postos, com nomes diferentes, tônicas diferentes, mas dificuldades iguais. Caminhamos pouco ou nada, me desculpem o pessimismo.
“Outro traço em comum era a esperteza e a falta de transparência nas relações comerciais – o famoso “ jeitinho brasileiro”, que já assustava os viajantes estrangeiros aqui chegados pela primeira vez depois da abertura dos portos. Ao descrever o comportamento dos comerciantes baianos, o inglês Thomas Lindley afirmou: Em seus negócios, prevalece a astúcia mesquinha e velhaca, principalmente quando efetuadas as transações com estrangeiros, aos quais pedem o dobro do preço que acabarão aceitando por sua mercadoria, ao passo que procuram desvalorizar o que terão de obter em troca (..) Numa palavra: salvo algumas exceções, são pessoas inteiramente destituídas do sentimento de honra, não possuindo aquele senso geral de retidão que deve presidir toda e qualquer transações entre os homens”
Também é uma experiência bacana para conhecer detalhes ja esquecidos do tempo da escola, ou para desmistificar momentos já romantizados, como o grito do ipiranga (com o principe regente em plena crise de dor de barriga), a proclamação da república, ou o enforcamento de Tiradentes. 
"Na falta de símbolos genuinamente brasileiros que representassem o novo regime, foi preciso improvisar. Cantou-se A Marselhesa, entoada em Paris na revolução que derrubou a Monarquia na França. (...)Hasteou-se uma bandeira que imitava os traços do estandarte dos Estados Unidos da America, outro país-modelo republicano, substituindo-se as cores azul e branco das faixas horizontais pelo verde e amarelo."

Somos crônicos ignorantes de nosso próprio passado, e como já foi dito por historiadores, condenados desta forma a repeti-lo. Recomendo esta leitura, como primeiro passo nesse caminho que a cada dia se descortina.

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