O Mistério Sittaford

Agatha Christie, conhecida mundialmente como "Rainha do crime", é uma das escritoras mais lidas, traduzidas e publicadas do mundo. Gerações inteiras crescem lendo e se envolvendo nos romances de mistério e intrigas da autora inglesa, cujo cheque-mate segue o ritmo certo para prender a atenção: segredos codificados nos mínimos detalhes. 

A receita não é diferente em "O Mistério Sittaford" (original 'The Sittaford Mystery', tradução de Carlos André Moreira, editora L&PM, 2010, pág. 256), onde o fio condutor parte do assassinato do capitão endinheirado (e pão duro) Joseph Trevelyan, proprietário da mansão Sittaford  e de mais seis bangalôs próximos ao palacete. A revelação do homicídio ocorre de forma curiosa, já que acontece por meio do jogo mesa-girante, apontado como possibilitador de atividade mediúnica e muito popular na Europa e EUA a partir do século XIX.

Registro fotográfico de pessoas jogando mesa-girante

A investigação da polícia leva ao nome do sobrinho do capitão, James Pearson, que carrega no histórico certos "pecadilhos financeiros" efetuados na empresa onde trabalha, além de ter estado presente no local do crime e se evadido de forma imediata. Sendo o principal acusado, o jovem boêmio só pode contar com os esforços e determinação de sua noiva, Emily Trefusis, descrita no livro como uma mulher bonita e bastante focada. Ao invés de seguir o perfil de "noiva aflita, com os nervos em frangalhos", Emily emprega toda a sua inteligência em descobrir quem é o verdadeiro assassino do capitão Trevelyan. Para isso, conta com o apoio do jornalista Charles Enderby, enviado para cobrir o fato e, como todo bom jornalista (pelo menos assim o dizem), faz tudo pelo furo, pela notícia de primeira mão.

Como jornalista, me diverti bastante com o senso comum empregado para descrever os profissionais da imprensa, tidos como "abutres oportunistas", conceito que parece estar impregnado no imaginário popular - na maioria das vezes, não sem razão. 

"Conheço bem os da sua espécie. Nenhuma decência. Nenhuma discrição. Juntam-se ao redor de um homicídio como urubus rondando uma carcaça". (Pág. 62)

"O Mistério Sittaford" traz toda a perícia literária-criminal que tornou Agatha Christie famosa, e foi considerado pelo The New York Times como "um dos melhores [livros] que ela já escreveu". Eu o achei interessante, palpável, com um toque de realidade maior, mas mesmo com quase doze anos de convivência com a "rainha do crime", ainda sinto algumas peças faltando no tabuleiro. Explico: o desfecho é surpreendente, os bandidos geralmente são pessoas acima de qualquer suspeita, mas em quase todos os livros que li da autora, achei que faltou um ponto de ligação entre o criminoso e o motivo. Apesar das pistas que Agatha vai lançando no decorrer do livro, percebo que na maioria dos casos, a biografia dos culpados é pouco esmiuçada, e a razão do delito costuma ficar solta no ar. Mesmo essa "falha" não ofusca o brilho dos romances da escritora inglesa, sempre cheios de segredos e imaginação.


Plus:

Neste link, você pode conferir um documentário super bacana sobre vida e obra da Agatha Christie (áudio em inglês).

Agatha Christie: A "rainha do crime"

"O Mistério Sittaford" ganhou uma adaptação (com muita licença poética, por sinal) para a televisão, em forma de série. Assista aqui o episódio completo (somente em inglês).

O Dose Literária também traz comentários a respeito dos livros "Um Pressentimento Funesto" e "O Natal de Poirot". Não deixe de ler.

Comentários

  1. Oii!
    Agatha Christie tem um poder impressionante de prender seu leitor, na minha opinião uma das melhores senão a melhor do seu gênero. Bem interessante a temática desse livro, o qual ainda não li, as mesas girantes do séc XIX foram uma sensação na época, foram delas que se originou os primeiros estudos para a formalização do Espiritismo. Não conhecia esse livro, mas já coloquei na minha lista de futuras leituras.
    Abraços
    Melissa Padilha
    decoisasporai.blogspot.com.br

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  2. "o desfecho é surpreendente, os bandidos geralmente são pessoas acima de qualquer suspeita, mas em quase todos os livros que li da autora, achei que faltou um ponto de ligação entre o criminoso e o motivo."
    Mara!!! Você falou tudo sobre Agatha Christie. Quero dizer, só li um livro dela até hoje mas foi exatamente NESTE PONTO que percebi falha, a única, aliás. Como eu falei lá na resenha d'O Natal de Poirot, a impressão que dá é que Christie começou a escrever a história sem saber, ela mesmo, quem seria o criminoso no final, e meio que as pressas, depois de eliminar todos os suspeitos, define aquele menos improvável, mas acaba não fazendo tanto sentido, é de cair em torpor e perder os sentidos por segundos, de tão inacreditável.
    Fabulosa esta resenha! <3

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  3. Oi. Então; estava procurando um trecho específico deste livro (meu preferido da Agatha) e então achei seu blog. Bom, para começar este comentário gigante, eu gostaria de dizer que concordo com você sobre os desfechos dos livros. Em "Encontro com a morte", o motivo do assassinato é mencionado de passagem por Poirot, rassim como em "Testemunha ocular do crime", onde a razão para o homicídio parece ter sido forjada de última hora. Em "O Mistério de Sittaford" eu já tinha um palpite sobre o assassino, e confesso que fiquei decepcionado quando ele se confirmou. Mas deixando o assassinato de lado (o que parece estranho e desconexo quando falamos de Agatha Christie), há elementos nesta história que não são típicos da maioria. Um exemplo é a aversão a mulheres do Capitão Trevelyan, que pode muito bem ser inrerpretada como uma suposta homosexualidade, palavra essa ligada à Marinha e aos ingleses (não falo de One Direction; favor ler "Uma vez só é pouco" de Jacqueline Susann e "Segredos de amor" de Danielle Steell) por motivos que nem sei ao ceryo, mas que são existentes. Também posso citar a singularidade da personagem central. Neste livro, Agatha deixou de lado a perfeição do crime e de sua resolução, focando nos temas da vida e da natureza humana, assim como fez nos livros escritos sob o pseudônimo de Mary Westmacott. Aproveitando a oportunidade, vou deixar o link do meu blog, também adoro livros. http://read-the-press.blospot.com

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