Cartas Portuguesas - Mariana Alcoforado

Cartas Portuguesas, da coleção L&PM Pocket Plus (72 páginas) é composta por 5 cartas de autoria de Mariana Alcoforado destinadas ao seu amado Cavaleiro de C.

Desde a Primeira Carta, Mariana fomenta um ardente e insalubre amor pelo cavaleiro, após tê-lo visto pela primeira através da janela do convento em que cumpria seu calvário. Um sentimento por vezes incondicional, outrora egoísta, pois direciona todos os seus pensamentos ao mancebo esperando a retribuição e o sonho de viver um amor arrebatador, no entanto, seus sentimentos são ingênuos e imaturos.
Mas não vamos condenar nossa pequena freira pela inexperiência amorosa, que diante das adversidades deste recente acontecimento emocional em sua vida, amadurece e passa a perceber o quão adoecida de amor se encontra, amor este incorrespondido, percebível desde as primeiras páginas.
Mariana se entrega, “Mil vezes ao dia dirijo para ti os meus suspiros”, e descreve seus pensamentos e sentimentos com tamanha sinceridade e ardor, que abala até mesmo o mais petrificado dos corações. Em suas palavras: “Parece-me, contudo, que chego até a prezar as desgraças de que és a única causa: dediquei-te a minha vida assim que te vi e sinto algum prazer sacrificando-a a ti.”
Ora demonstra extrema felicidade ao sentí-los sem esperar nada em troca, ora deseja ser correspondida e desconjura o amado por sua insensibilidade quanto às suas mais profundas palavras extraídas do âmago de sua alma. Em termos modernos, Mariana era bipolar.
Talvez o seu querido, apercebido de sua inconstância sentimental, tenha preferido não retribuir os mesmos sentimentos pelas epistolares declarações justamente por este motivo. Julgo como “talvez”, pois somente as cartas da apaixonada estão publicadas neste livro, com somente alguns comentários que a própria o faz a respeito das cartas do cavaleiro, o que nos leva a imaginar quais seriam as suas respostas e porquê afligiam tanto a freirinha.
Desiludida, Mariana se torna sombria, mórbida e enferma; sofre, implora pelo amor do Marquês que aparentemente tem sua paixão dedicada à outra mulher e vida dedicada à carreira no exército.
O que poderia vir a ser uma linda história de amor, se encerra de uma maneira quase trágica. Carta após carta, linha após linha, o leitor de compadece das súplicas de compaixão da escritora ao seu amado, que por fim, declara  somente sentimentos de amizade pela nossa escritora.

Mas antes que você pense que a história se resume toda ai que eu tenha até mesmo estragado (spoiler) o enredo, muitos fatos levam o leitor à interpretar tais cartas a sua maneira. Tanto é que alguns dos leitores mais notáveis de Cartas Portuguesas como Stendhal e Rousseau, dedicaram tempo aos estudos sobre veracidade de tais missivas, pois na época em que foram publicadas eram com a alcunha de “Anônimas”, o que instigavam os leitores e estudiosos a buscar mais informações a partir de conclusões filosóficas sobre o conjunto da obra.

De narrativa sem precedentes, Cartas Portuguesas ou Cartas de amor de uma religiosa portuguesa escritas ao cavaleiro de C, é um clássico da literatura mundial, de riqueza vocabular e poética, que recomendo à todos que apreciam literatura clássica do século XVII.

"O Beijo" escultura de Auguste Rodin (em 13 de Abril, dia mundial do beijo)

No texto sobre Florbela Espanca que transcrevi na Semana da mulher, comentei que este livro muito em breve estaria em minha estante, começo a acreditar piamente no poder das palavras que proferimos e dos desejos os tornarem uma realidade. Este livro não chegou em minhas mãos caído dos céus, mas via correios, enviado pela amiga Patricia Oliveira, que inesperadamente me presenteou com esta linda jóia da literatura portuguesa.

Mariana Alcoforado (1640-1723) nasceu em Beja, Portugal. Entrou para a clausura com 12 anos e passou a vida num convento. Ao longo de sua vida religiosa, a freira exerceu as funções de escrivã e de vigária. Em 1663 teria conhecido um oficial francês que serviu em Portugal durante as guerras da Restauração, o Marquês de Chamilly. As Cartas portuguesas, publicadas na França em 1669, seriam a correspondência amorosa mantida entre ambos quando do retorno do oficial ao seu país. Mariana Alcoforado faleceu em sua cidade natal, com 83 anos.

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